Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP

O que é preciso é avançar e não andar para trás

Comício, Queluz

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[Excerto]

Estamos prontos a travar a próxima batalha eleitoral de 6 de Outubro para a Assembleia da República que precisamos de tomar também já em mãos.

Aqui estamos, para tudo fazer para construir o caminho que permita o País avançar e não andar para trás. Prontos para desenvolver a luta de massas. Dos trabalhadores, em cada empresa e local de trabalho, pelos salários e pelos direitos, das populações pela defesa dos serviços públicos, da juventude contra a precariedade e pelo direito à Escola Pública, gratuita e de qualidade, das mulheres pela defesa da igualdade, dos pequenos e médios agricultores, pescadores e empresários em defesa da produção nacional, dos pensionistas pela elevação das suas condições de vida.

Aqui estamos, num momento que continua marcado pelos importantes avanços na reposição, defesa e conquista de direitos concretizados nestes três anos e meio da nova fase da vida política nacional.

Avanços alcançados pela luta de massas e pela persistência da acção do PCP. Avanços que significam melhorias muito significativas nas condições de vida dos trabalhadores e do povo.

Avanços, entre outros, na reposição de vários direitos roubados como salários e feriados, o aumento do Salário Mínimo Nacional, ainda que aquém do necessário e possível, subsídio de Natal, feriados, no aumento e valorização de reformas e pensões, apoio aos desempregados, abonos de família, na redução dos impostos sobre o trabalho. Que se avançasse nas condições de reformas das longas carreiras contributivas, na eliminação do Pagamento Especial por Conta beneficiando milhares de pequenos e médios empresários, na redução do preço da energia, entre muitos outros.
Conquistas cuja importância e impacto na vida imediata dos portugueses é exposta com particular nitidez na gratuitidade dos manuais escolares nos 12 anos de escolaridade obrigatória, abrangendo mais de milhão e meio de crianças e jovens, dando um passo mais na garantia de acesso à educação em condições de igualdade, e no alargamento do Passe Social Intermodal, com a redução do seu preço, garantindo um significativo alargamento do direito à mobilidade, com impactos positivos no plano ambiental e nas importações do País.

Quantos, há três anos e meio, julgariam que estes avanços eram possíveis? Quantos, dos que acompanhavam as propostas do PCP, de há décadas, sobre estas duas questões em concreto, sucessivamente rejeitadas por PSD e CDS, mas também pelo PS, acreditariam que elas se concretizassem? Aqueles que pagavam 100, 150 e mais euros por um passe social para ir para o trabalho, aqueles cuja perspectiva era de, no início do próximo ano lectivo, irem gastar 150 ou 200€ em livros escolares para os seus filhos, estariam longe de imaginar que se desse este notável salto.

Avanços conquistados a pulso. Avanços que não estavam no Programa do PS, nem no Programa do Governo. Avanços, alguns dos quais, o PS começou mesmo por recusar e foram conquistados contra a sua vontade.

Até porque eles não ocultam a ausência de resposta a prementes problemas do povo e do País, impossíveis de resolver no quadro de submissão às regras e imposições do Euro e da União Europeia e aos interesses do grande capital.

Por muito que o PS queira mostrar que encontraram a fórmula da solução da quadratura do círculo, dizendo que se pode fazer uma coisa e outra, aí está a ausência de investimento público, aí está a degradação dos serviços públicos de transportes, do Serviço Nacional de Saúde, da Escola Pública, da Segurança Social, aí está a falta que fazem os trabalhadores da Administração Pública a mostrar essa contradição.

Bem podem PSD e CDS fingir sincera preocupação de última hora, que não se livram da responsabilidade que têm de aprovar na União Europeia e aceitar cá, no nosso País, essas regras do défice e da dívida, esse autêntico garrote que constituem os juros da dívida, para onde são escoados milhares de milhões de euros tão necessários ao desenvolvimento do País.

Assistimos à tentativa de rasura da memória sobre as responsabilidades de quem nos trouxe até aqui. PS, PSD e CDS, e os centros de decisão ao serviço do grande capital procuram fazer esquecer quem promoveu, aprovou e executou o PEC 1, o PEC 2, o PEC 3 e quem concebeu, subscreveu e executou com requintes de malvadez o Pacto de Agressão com a troika estrangeira.

E querem fazer esquecer quem foram os executores da política de direita ao longo de mais de quatro décadas.

E é por isso que assistimos à intensificação da ofensiva dos sectores mais reaccionários para recuperar espaço e tempo perdido na intensificação da exploração, na liquidação de direitos e na subversão da democracia que diziam inevitável; à instrumentalização de justos descontentamentos e à promoção de operações provocatórias para atacar e descredibilizar os serviços públicos e as funções sociais do Estado; ou à criação e amplificação de conflitos raciais, geracionais e outros para alimentar um sentimento de intranquilidade, tal como a instrumentalização de preocupações ambientais.

Estes são traços marcantes da situação nacional que não foram alterados, nem pelos resultados das eleições para o Parlamento Europeu, nem pela manobra do Governo PS de instrumentalizar a questão da contagem do tempo de serviço dos trabalhadores das carreiras especiais, com a chantagem e a ameaça de uma crise política artificial que confirma três dos aspectos para os quais o PCP já tinha muitas vezes alertado.

O primeiro, que o PS não hesitará, se tiver condições para tal, em colocar as imposições e os constrangimentos da União Europeia à frente da resposta aos problemas dos trabalhadores, do povo e do País. Aí os ouvimos, a partir do primeiro-ministro, usar os mesmos argumentos, as mesmas expressões, as mesmas justificações de Passos e Portas, os argumentos da troika, em síntese, para não devolver aos trabalhadores o que é seu por direito.

A segunda, que não será pela mão do PS que o caminho de avanços na defesa, reposição e conquista de direitos prosseguirá, e fica mesmo evidente que, se o PS tiver as mãos completamente livres, o que foi alcançado corre o sério risco de andar para trás.

A terceira, é que ficou claro, uma vez mais, que é na convergência com PSD e CDS que o PS encontra o apoio para todas as medidas contrárias aos interesses do povo e do País. Foi assim na concretização dos apoios de milhões para a banca, para avançar com o ilusório e falso programa de descentralização autárquica, para inviabilizar todas as propostas e iniciativas legislativas do PCP sobre leis e direitos laborais. Foi assim, ainda recentemente, com a posição convergente em relação à reposição do tempo de serviço dos trabalhadores das carreiras especiais.

Percebe-se camaradas. A nova fase da vida política nacional não alterou a natureza do PS, nem o seu vínculo à política de direita. O PS não mudou, o que obrigou o PS a decidir medidas a favor dos trabalhadores e do povo, foram as circunstâncias e os elementos de enquadramento políticos e institucionais, e particularmente a força do PCP. É dessas circunstâncias que o PS se quer libertar para poder regressar sem condicionamentos à política que ao longo de mais de quarenta anos, no essencial, executou.

Se outras provas não houvessem, e há, o Programa de Estabilidade para 2019/2023, que o Governo PS apresentou e submeteu a visto prévio de Bruxelas, aí está para o demonstrar, confirmando a submissão ao Euro e às imposições da União Europeia, e aos interesses dos grandes grupos económicos, com a resposta ao cortejo de «recomendações» e ameaças do FMI e da União Europeia, e mantendo o País amarrado a uma trajectória do défice que impõe níveis inaceitavelmente reduzidos de investimento e de financiamento dos serviços públicos, uma opção que PSD e CDS também acompanham.

Há outras provas, designadamente o debate em curso na Assembleia da República de alterações ao Código do Trabalho, com a proposta de lei do governo que intensifica a precariedade e agrava a exploração, e não revoga as normas gravosas, designadamente a caducidade da contratação colectiva, nem repõe o princípio do tratamento mais favorável. Uma vez mais, PS, PSD e CDS, bem unidos quando estão em causa interesses de classe do grande capital, bem unidos contra os direitos dos trabalhadores.

Ora, perante este quadro, não nos cansamos de repetir que o que é preciso é avançar e não andar para trás.