Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP, , Lisboa

Esta Declaração Programática é uma clara e inequívoca proposta de política alternativa

Permitam-me saudar todos os presentes nesta apresentação da Declaração Programática do PCP para as eleições para o Parlamento Europeu, e em particular os nossos amigos na CDU, os representantes do Partido Ecologista os Verdes e a Intervenção Democrática.

Assumimos a Declaração Programática que hoje apresentamos publicamente como um compromisso dos comunistas portugueses para com os trabalhadores, o povo e o país.

Um compromisso do PCP, e dos seus candidatos no âmbito da CDU, que assenta na profunda confiança de que o rumo de destruição económica, de empobrecimento dos trabalhadores e do povo, de regressão social e de ataque à soberania nacional não é inevitável e pode ser invertido.

Um compromisso nascido de anos de luta e de proposta do PCP, porque emanado da profunda ligação deste Partido aos anseios e aspirações dos portugueses.

É um compromisso que fala verdade, um compromisso solene de, na continuidade do trabalho realizado pelos nossos deputados no Parlamento Europeu, assumir a responsabilidade de, nas instituições e fora delas, dar voz à luta do nosso povo e defender os interesses nacionais numa Europa de cooperação, assente no respeito pela vontade dos povos e na defesa dos valores da solidariedade, da democracia, da paz e do progresso social.

Mas esta declaração Programática é também e simultaneamente um desafio aos trabalhadores e ao povo. Um desafio porque sabemos bem que a alteração da situação nacional, a ruptura com o actual rumo de submissão do País aos interesses do grande capital e do directório de potências da União Europeia não é possível sem a acção, a luta e a convergência dos trabalhadores e do povo e de todos os democratas genuinamente interessados em defender os valores e ideais da Revolução de Abril.

Luta e convergência tão mais possível quanto maior o apoio a uma política patriótica e de esquerda, que dê expressão a essa ideia tão simples mas tão poderosa de que é no povo que reside a força e o poder para alterar o rumo da História e construir um futuro alternativo, progressista para Portugal e também para a Europa.

Por isso, esta Declaração é também uma clara e inequívoca proposta política alternativa, que assume um projecto político distinto das políticas que os subscritores do Pacto de Agressão (PSD, CDS e PS) e defensores do actual rumo da integração europeia executam há 37 anos no nosso País.

Um projecto político que nos distingue de todos os outros, quer pela concepção de Europa que explicita, quer pela ligação que faz da luta por essa outra Europa a uma profunda mudança na vida nacional, sustentada na ruptura com a política de direita e na construção de uma alternativa política patriótica e de esquerda.

Um Projecto que não se limita a dar justa expressão ao descontentamento e revolta da maioria da população, mas que assume uma postura de esperança e de possibilidade de romper com as principais opções e políticas que estão na origem da crise no nosso País e também na União Europeia.

Uma crise que demonstra bem os limites, quer da política de direita praticada em alternância pelo PS, PSD e CDS, quer do rumo capitalista da integração europeia, cada vez mais esgotado e confirmado como contrário aos interesses dos trabalhadores e dos povos.

Uma crise a pretexto da qual se desenvolve uma devastadora ofensiva contra os direitos e rendimentos do povo e cujas consequências os seus responsáveis tentam agora esconder por via de uma vergonhosa campanha de manipulação, mistificação e mentira, mas que infelizmente a vida de milhões e milhões de portugueses prova estar aí e ter grandes e nefastas consequências económicas e sociais.

Esta declaração assume-se, por isso, não apenas como um conjunto de propostas já amplamente explicitadas pelo camarada João Ferreira, mas sobretudo como um projecto de acção e intervenção.

Acção e intervenção de uma força a quem a realidade deu e dá razão.

Uma força que, no tempo certo, alertou para a natureza e para as consequências das linhas orientadoras da política de direita e da integração capitalista.

Uma força que quando confrontada com a campanha do paradisíaco processo de integração na CEE/UE chamou a atenção para a destruição do nosso sector produtivo e do endividamento que dele iria resultar.

Uma força que, quando PS, PSD e CDS comemoravam a entrada de Portugal no Euro, chamou a atenção para o projecto de domínio dos mais fortes sobre os mais fracos que ele significaria e para as consequências que teria para a economia nacional, para os direitos sociais e laborais dos portugueses e para a perda de instrumentos de soberania.

Uma força e um Partido que, quando quase todos se reuniam em faustas comemorações da assinatura do Tratado de Lisboa, esteve na primeira linha da denúncia desse dito Tratado, afirmando que ele iria acentuar ainda mais a concentração de poder económico e político num directório de potências liderado pela Alemanha e iria abrir caminho a políticas de autêntica colonização económica e política.

Uma força que, quando PS, PSD e CDS se uniam para submeter o país ao dito programa de assistência económica e financeira, vendendo-o como uma ajuda a Portugal, afirmou sem tibiezas que se tratava de um Pacto de agressão contra o povo e o país que iria acentuar ainda mais a crise económica e social e comprometer o futuro de Portugal por muitos mais anos.

Um Partido que foi dos primeiros a alertar para a gravidade da assinatura do chamado Tratado Orçamental nas costas e às escondidas do povo, alertando para o reforçado colete-de-forças que este significaria para Portugal e para o objectivo que comporta de eternização das medidas anti-sociais que comporta.

A realidade aí está a dar razão ao PCP e à CDU. Fruto de 37 anos de política de direita e de 28 anos de integração capitalista, Portugal vive hoje um dos períodos mais negros da sua história.

Venderam-nos durante anos um paraíso económico à boleia da União Europeia. O que temos hoje? Regressão económica, alienação do património do Estado, entrega ao grande capital e ao capital estrangeiro de sectores de importância estratégica para o País, défices estruturais insustentáveis como o alimentar, o produtivo, o energético ou mesmo o tecnológico, uma dívida impagável que, só nos últimos três anos, aumentou em 51 mil milhões de Euros.

Andaram durante anos com a ladaínha do pelotão da frente, do clube dos ricos da Europa. O que temos hoje? Divergência acentuada relativamente aos países mais ricos da Europa. Um País submetido no plano económico à chantagem e extorsão dos ditos mercados que vende os anéis e os dedos para alimentar a gula dos grandes grupos económicos e financeiros. Um País que, no plano das suas relações externas, se encontra completamente subordinado à estratégia da União Europeia, da NATO e das suas principais potências.

Encheram páginas de discursos com coesão social e solidariedade e o que nos mostra a realidade? Um País com os salários mais baixos da zona Euro, um ataque brutal aos direitos laborais e sociais do nosso povo, 3 milhões de cidadãos empurrados para a pobreza, degradação e encerramento de serviços públicos, milhão e meio de desempregados.

É esta a amarga realidade que dá, de facto, razão ao PCP e à CDU. Mas não nos dá qualquer regozijo termos razão.

O que a realidade nos coloca é uma ainda maior responsabilidade para inverter este rumo, para efectivar uma real mudança no país. Uma mudança que não é apenas uma palavra de propaganda, que não é vazia de conteúdo.

Falamos de mudança, sim. Mas não de uma dita “mudança de rumo” de cosmética ditada por calendários eleitorais. Falamos de uma mudança pela qual lutamos todos os dias. Uma mudança que não é indefinida no que toca a questões como a recuperação de salários e de direitos ou que, quase ridiculamente se auto-agenda “lá para o ano que vem”, como afirmou António José Seguro ao tornar claro que abandonou de vez o que de facto nunca tinha defendido verdadeiramente, a necessária e urgente demissão do Governo.

Falamos de uma mudança que nasce da luta dos portugueses, que assenta nos seus direitos. Uma mudança que implica uma ruptura com o velho, com o que está para trás, para construir o novo. É por isso também uma ruptura com as propostas e os enganos que os candidatos do mal chamado arco da governação vêm agora mais uma vez vender.

Uma ruptura que comporta esperança, que rejeita o conformismo e as sentenças de morte aos direitos dos portugueses, e à soberania nacional que Cavaco Silva, aquele que deveria ser o primeiro garante desse inalienável direito do povo português, vem agora mais uma vez lançar, demonstrando o real valor que de facto dá à democracia e à soberania nacional.

A nossa mudança, a mudança que está presente nesta declaração programática é a única e verdadeira alternativa à política de direita que une Rangel e Assis. Uma mudança assente na ideia de um Portugal com futuro, numa Europa dos trabalhadores e dos povos.

Uma mudança que implica recuperação de direitos, de desenvolvimento e de soberania. Uma mudança que está em clara ruptura com as propostas e projecto do PS, PSD e CDS que não têm outras soluções que não seja oferecer mais do mesmo, aprofundando e agudizando os problemas existentes e de forma crescente, degradando a democracia e afastando os povos das decisões essenciais que determinam o seu futuro.

Não têm outras soluções porque, mesmo tentando esconder as suas opções em aparentes críticas à política da União Europeia, insistem nos mesmíssimos caminhos.

Tecem veladas críticas aos crescentes fossos na União Europeia, mas insistem no federalismo, ou seja na ainda maior concentração de poder no directório de potências.

Enchem a boca com a palavra crescimento mas logo vêm falar da chamada competitividade, ou seja, mais privatizações, flexibilização das relações laborais e retirada de direitos.

Falam hipocritamente dos perigos dos “nacionalismos” na Europa, mas insistem na defesa das medidas que impõem aos países o modelo neoliberal e de colonização económica, sistematizado no Tratado Orçamental que todos aprovaram.

Escrevem eloquentes frases sobre a defesa dos interesses nacionais, mas insistem numa arquitectura institucional da União Europeia que cada vez reduz mais a voz e o peso de países como Portugal.

Falam da defesa do emprego, mas simultaneamente defendem as medidas económicas que estão na sua origem e que estão plasmadas, quer no Tratado Orçamental, quer nas medidas da Governação Económica, da Estratégia vinte vinte ou do semestre Europeu.

De facto, ao olharmos para os tais 101 tweets de Rangel ou para a tal mudança de rumo de que o PS vem agora falar, tiramos duas conclusões principais:

A primeira é que, em geral, e sobretudo em matéria de política europeia, estas duas candidaturas quase que parecem siamesas. Não espanta, bastaria relembrar por exemplo que Francisco Assis tem sido um dos mais entusiásticos defensores daquilo que o PSD e Cavaco andam há muito a defender, um mal chamado bloco central para continuar a política de direita para lá do Pacto de Agressão, o tal pacto não de regime, mas contra o regime democrático.

E é exactamente por serem, em numerosos aspectos, candidaturas siamesas que também não espanta que se dediquem neste início de pré campanha a discussões em torno de questões de pormenor como aquela sobre quem é que está mais ou menos cotado nas suas duas famílias políticas europeias, o PPE ou o Partido Socialista Europeu. Tema aliás mal escolhido para se tentarem diferenciar, uma vez que, como a realidade em França, na Alemanha ou na Itália bem demonstra, a identidade de políticas entre estas duas ditas famílias políticas europeias é mais do que evidente.

A segunda conclusão que retiramos é que, com algumas mudanças de linguagem e aparentes distanciamentos do rumo actual, o que de facto ambos têm para oferecer é mais do mesmo.

O que ambos defendem é uma União Europeia crescentemente comandada pelo directório das grandes potencias, onde quem manda é a Alemanha e os outros obedecem, incluindo a Comissão Europeia.

O que ambos defendem é uma União Europeia que mantenha a sua matriz neoliberal agora aprofundada com o Tratado Orçamental e as suas regras de regressão social que formata a agenda comum dos partidos da direita e da social democracia.

Uma agenda que, como a realidade demonstra e as declarações do Presidente da República, falando por eles todos, vem confirmar que pretendem continuar insistindo nos cortes de salários, das funções sociais do Estado, no aumento de impostos para quem trabalha e na sua diminuição para o capital, nas privatizações de quase todas as esferas da vida económica e social, entre várias outras medidas.

O que têm para oferecer PS, PSD e CDS é uma União Europeia em crescente divergência, aprofundando assimetrias sociais e territoriais.

O que têm para oferecer é a União Europeia dos grandes grupos económicos e da centralização da riqueza à custa da exploração e da liquidação da soberania dos povos sobre o seu destino.

Ou seja, as falsas soluções que os partidos que nos trouxeram até aqui têm não passam da continuação, embora num caso ou noutro com novas roupagens, das mesmas políticas que nos conduziram à crise. E essa é a razão de fundo porque a nossa candidatura é de facto a única candidatura verdadeiramente alternativa ao actual rumo, seja para Portugal, seja para a Europa.

Os partidos da direita governamental, PSD e CDS, e também o PS, não lidam bem com esta comprovada realidade e respondem que são eles os exclusivos portadores de uma política para a Europa.

Trata-se, mais uma vez, da estafada táctica de nos tentar empurrar para as cordas dos que são contra a Europa e de assim tentarem relançar a velha bipolarização, resumindo o debate pré eleitoral a uma conversa a dois.

Mas a essa tentativa queremos responder com duas questões essenciais para estas eleições:

A primeira, que já lhes respondemos tantas vezes é que a Europa não é uma coutada ideológica do PS e do PSD nem um qualquer conceito por si inventado e portanto de uso exclusivo. Não! A Europa é uma realidade objectiva, um conjunto de povos e nações, cada uma com a sua história, identidade, realidade, cultura e liberdade.

Compreendemos que tentem lançar a confusão entre Europa e União Europeia, é a forma de tentarem defender no limite a sua criação e esconder as suas insanáveis contradições.

Mas a eles respondemos que não terão sucesso e relembramos que Portugal e os portugueses foram, são e serão europeus, independentemente das opiniões que tenham sobre o actual rumo da integração europeia.

A eles queremos relembrar que não caímos nessa esparrela. Não!

O que lhes dizemos claramente é que, o que nos move, em primeiro lugar, são os interesses dos trabalhadores e do povo português e não os dos grandes grupos económicos. O que lhes dizemos é que a nossa luta em defesa do nosso povo e contra a União Europeia do grande capital é a melhor contribuição que podemos dar para defender a Europa, porque a Europa são os seus trabalhadores e os seus povos.

A eles dizemos que defender a Europa passa, em primeiro lugar, por derrotar as políticas que estão a fazer o nosso continente regredir décadas. Lutar pela Europa é defender políticas ao serviço dos trabalhadores e dos povos e não ao serviço dos grandes monopólios.

Como está bem patente na Declaração Programática que apresentamos, a nossa Europa não é a União Europeia do directório das grandes potências, dos que tudo mandam e podem à margem da democracia, das necessidades de desenvolvimento e dos direitos dos povos e em aberto confronto com a sua soberania.

Essa definitivamente não é a nossa Europa.

A nossa Europa, não é a sua União Europeia do Tratado Orçamental, do Pacto de Estabilidade Reforçado, da União Bancária, do salto federalista, do fundamentalismo monetarista do BCE e da ditadura dos “mercados”.

A nossa Europa não é a União Europeia da regressão nos direitos laborais e sociais para acentuar a exploração. Não é a União Europeia dos Pactos de Agressão que destroem economias e vidas.

A nossa Europa não é a consolidação de uma União Europeia autoritária e antidemocrática que ataca as constituições dos seus Estados membros e que usurpa o papel dos orgãos de soberania nacional como os Parlamentos Nacionais.

A nossa Europa não é uma União Europeia que, como a realidade em vários pontos do globo o demonstra, cada vez mais se afirma com uma concepção imperialista de bloco político militar, pilar Europeu da NATO e da sua política de constante provocação de conflitos no plano internacional.

Essa não é a nossa Europa, porque a nossa Europa nunca poderá ser construída contra os trabalhadores e os povos. É por isso que a nossa Europa, não é também a sua União Europeia fortaleza dos campos de retenção para imigrantes.

A nossa Europa, a outra Europa porque lutamos é, como está bem descrito nesta declaração programática – a dos trabalhadores e dos povos, onde um Portugal com futuro, com direitos, desenvolvimento e soberania se inserirá de livre vontade, contribuindo para uma verdadeira cooperação direccionada para o progresso social e a solidariedade.

A segunda resposta que queremos dar ao PSD e ao PS e à sua tentativa de uma conversa a dois sobre a tal dita Europa é a seguinte:

Não tentem empurrar apenas para a Europa o debate político necessário para o País. Estamos perante uma situação muito grave, que é incompatível com jogos mediáticos desse tipo.

Portanto aqui fica o desafio para que digam claramente o que pensam sobre o futuro do País. Que opções defendem para a política nacional. Que digam o que pensam realmente sobre as opções para os próximos anos. Que digam se pretendem recuperar salários e direitos. Que digam se vão aceitar a sentença de Cavaco. Que digam o que pensam sobre política laboral, sobre política fiscal, sobre desenvolvimento económico, sobre privatizações e nacionalizações, sobre como lidar com a questão da dívida, entre várias outras questões.

Por aquilo que já vimos, dizem muito pouco. Fazem-no porque se começarem de facto a falar, rapidamente fica demonstrado que são duas faces de uma mesma moeda.

Nós estamos neste combate com a profunda convicção de que não há soluções que se imponham para todo sempre contra a vontade dos povos. Não há soluções que resistam à sua continuada e persistente luta.

É com essa mesma convicção que afirmarmos que Portugal não está condenado à submissão e à dependência!

É possível assegurar, com outra política, a soberania e a independência do país e o seu desenvolvimento, capaz de assegurar a elevação das condições de vida dos trabalhadores e do povo, porque é possível, com a força do povo, é possível um Portugal com futuro, numa Europa dos trabalhadores e dos povos.

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