As USF e a falta de médicos e enfermeiros
A «reforma» no modelo Unidades de Saúde Familiar (USF) gerou desigualdades, sendo de improvável aplicação geral e de baixa sustentabilidade, inscreveu na lei a possibilidade da sua privatização.
A manterem-se as orientações até agora dominantes na definição na política de saúde, os Agrupamentos de Centros de Saúde podem tornar-se um novo instrumento de segmentação e privatização dos CSP.
Os Centros de Saúde devem ser dotados de efectiva autonomia administrativa e financeira, de direcção técnico-científica e de uma organização interna descentralizada e baseada numa rede de unidades/equipas multiprofissionais, com missões específicas e objectivos comuns.
Actualmente 77% dos médicos de família têm mais de 50 anos, quando em 2001 essa percentagem era apenas de 19%. Perante esta tendência, previsível, os sucessivos governos nada têm feito, e não serão as tardias e tímidas medidas do actual a inverter esta situação. As consequências estão à vista, com centenas de milhares de pessoas sem médico de família.
No que diz respeito aos Enfermeiros, a carência deriva apenas da política de restrição de trabalhadores na administração pública, que para além de ajudar ao desemprego, deixa os serviços de saúde em difíceis condições para dar resposta à população.
Considerando dados de produção da Administração Central dos Serviços de Saúde, podemos concluir que faltam nos hospitais portugueses, pelo menos 15 mil enfermeiros. Já nos centros de saúde e aplicando as regras da OMS, para que todos os portugueses tenham enfermeiro de família, serão precisos mais 5 mil enfermeiros. Faltam por isso no total 20 mil enfermeiros.
Os enfermeiros em falta em relação aos necessários são 35% em todo o SNS, 42% nos centros de saúde e 33% nos hospitais. E isto enquanto milhares de enfermeiros estão no desemprego e o Governo aposta na sua precariedade e na negação dos direitos mais elementares na sua carreira.
O aumento dos custos para os utentes
Entre 2003 e 2007 os gastos privados em saúde aumentaram 33%, de cerca de 3500 para 4600 milhões de euros. Ela corresponde já em 2007 a 2,8% do PIB e significa uma despesa média por família de cerca de 1200 euros por ano.
Uma parte significativa do aumento da despesa dos últimos anos deveu-se às medidas do Governo na área do medicamento. Ao contrário do que o Ministro Correia de Campos disse até sair do Governo, a despesa dos utentes com medicamentos aumentou de 671 para 766 milhões de euros entre 2005 e 2007.
O favorecimento do sector privado
Outra das razões para a degradação do serviço às populações foi a política de concentração de serviços, com encerramentos baseados em razões economicistas e em falsos critérios técnicos, para favorecer a política da obsessão do défice. Assim aconteceu com inúmeras extensões de saúde, com serviços de atendimento permanente, com urgências hospitalares, com maternidades e blocos de partos.
Em muitos sítios o serviço público foi substituído pelo privado, que passou a ser a única solução para as populações.
O “negócio” da saúde, cada vez mais invadido pela prestação de cuidados por parte do sector privado, representou em 2008 um volume total de cerca de 16 mil milhões de euros.
O Governo manteve o programa de parcerias público privadas, que impõe obrigações para o Estado durante mais de 30 anos. Medidas aplaudidas pelo PSD, partido originário desta política.
O Governo desenvolve uma política do medicamento completamente refém dos interesses privados do sector. Já assinou um acordo com a APIFARMA e outro com a ANF, sempre introduzindo graves medidas que prejudicam o interesse público. Criou algumas farmácias hospitalares, mas para as privatizar, abdicando de um instrumento fundamental de que o Estado carece para desenvolver uma eficaz política do medicamento.
Mas enquanto abundam as benesses para o privado, escasseiam os recursos para o serviço público. De 2005 até 2009 as transferências do Orçamento do Estado para o SNS, em percentagem do PIB, diminuíram de 5,1% para 4,8%, num claro desinvestimento nos serviços públicos de saúde.
Este enorme desinvestimento reflecte-se também no investimento público em saúde. Desde o início da legislatura o investimento público em saúde diminuiu cerca de 40%, de 100 milhões de euros para menos de 40 milhões. Comparando com o último orçamento dos governos de António Guterres, o de 2002, verificamos que este investimento era de quase 200 milhões de euros, cinco vezes mais do que é agora.
Mas se o orçamento do investimento público em saúde é de menos de 40 milhões de euros, o que o Estado paga, já em 2009, às parcerias público privadas é cerca de 140 milhões de euros, 3,5 vezes o que é atribuído ao investimento no SNS.
A farsa em torno do encerramento as maternidades
Um bom exemplo da orientação do Governo PS em relação à ao sector privado foi a questão das maternidades.
Encerrou as públicas com o argumento do critério da não realização de 1500 partos por ano e da segurança das parturientes no entanto e em relação às maternidades privadas o Governo já adoptou critérios diferentes.
Em 2007, segundo a ERS, dos 25 centros de nascimento privados, apenas dois faziam mais de 1500 partos por ano e apenas seis faziam mais de um parto por dia. Para além disso foram detectadas outras graves carências patentes no relatório da ERS. Nenhuma maternidade privada foi encerrada pelo Governo.
E agora a ERS já moderou as exigências num segundo relatório, definindo apenas como essencial a realização de pelo menos três partos por semana, isto é 157 por ano, isto é, 10 vezes menos do que o Governo considerou necessário no sector público.